O advogado Paulo Roberto de Aguiar Valente Júnior não cumpriu o que disse a um oficial de justiça, na terça-feira (20) e, nesta quarta (21), não entregou o filho de 3 anos de idade para a ex-namorada e mãe da criança, Catharina Bastos, 23, que tenta recuperar o menino desde abril. Ela tem a guarda da criança e o pai tem permissão para visitas com acompanhamento. Há três meses, Paulo levou o filho e até agora não trouxe de volta para a mãe. Catharina tornou o seu drama público na segunda (19). Nesta quarta, foi feita a terceira tentativa de mandado de busca e apreensão para resgatar o menino, mas os policiais encontraram a casa do advogado vazia.

De acordo com a advogada de Catharina, Mônica Santana, oficiais de justiça foram até o endereço fixo de Paulo juntamente com policiais militares para cumprir o mandado de busca e apreensão, mas a operação não teve sucesso. A informação foi confirmada pela Polícia Militar, através da 39ª CIPM.

“Foi frustrado mais uma vez. Já são três mandados em sete endereços diferentes. Hoje nós seguimos para a central de mandados para que o oficial certificasse o não cumprimento, para relatar que a criança não foi encontrada, indicando que ele descumpriu mais uma vez uma ordem judicial.  O mandado foi fechado e eu estou aguardando que o oficial junte no processo a certificação do não cumprimento”, afirma Mônica. Paulo tentou derrubar o mandado de busca e apreensão através do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), mas o pedido foi negado.

Através das redes sociais, a mãe da criança disse que acredita que a ação é uma estratégia de Paulo para ganhar tempo e que ele não teria intenção de devolver o filho. “Ele disse que quando houvesse uma ordem judicial, ela seria cumprida, mas não é o que está acontecendo. A desculpa agora é porque eu estou expondo o caso para a imprensa. Ele tem que cumprir a lei. Ele é advogado, mas não faz a lei. Ele está violando o direito do meu filho de conviver com a própria mãe. Se realmente amam o meu filho e pensando no bem estar psicológico dele, vão devolver o meu filho e vão cumprir a ordem para o meu filho voltar para casa”, desabafou Catharina.

A jovem ainda afirmou que recebeu informações e fotos que indicariam que Paulo e os avós da criança não teriam intenção de devolvê-la à mãe. “Eu recebi informações de que o genitor do meu filho estava hospedado em um hotel aqui de Salvador, eu tenho provas. Na terça-feira, eu recebi fotos do meu filho fantasiado com os avós em Praia do Forte, o que só comprova a tentativa de fuga para que o meu filho não seja encontrado. Isso prova a não intenção de não entregar o meu filho e mais uma vez descumprir a ordem judicial”, acusa.

O CORREIO não conseguiu contato com o pai da criança e nem com seus advogados.

Mais um caso 

Catharina não é a única mãe a ser forçada a ficar longe do filho. A administradora de empresas Sandra Gomes Ramos passa pela mesma situação já há sete meses. Ela, que mora em Irará, região metropolitana de Feira de Santana, deixou a filha de cinco anos passar as férias em Salvador com o pai, o servidor público Raimundo Pereira da Silva Júnior, em dezembro de 2020. Segundo Sandra, Raimundo afirmou que não devolverá a criança e impediu, por diversas vezes, o contato entre mãe e filha.

Sandra está sem ver a filha há sete meses (Foto: Arquivo Pessoal)

Sandra disse que atendeu a um pedido da avó paterna de sua filha, que alegou sentir saudades da neta. Até então, a avó e o pai da criança moravam na mesma casa. Mas, após a menina chegar em Salvador, Sandra descobriu que, na verdade, Raimundo estava em outro apartamento e, dias depois, a criança saiu da casa da avó e passou a morar na casa do pai.

“A minha filha também estava sentindo a falta do pai porque já tinha na época um ano e dois meses que ele não procurava ela. Achei que uma aproximação dos dois seria algo positivo”, diz Sandra. Mas não foi bem assim. Conforme o tempo foi passando e o final das férias foi se aproximando, Sandra diz que questionou Raimundo por diversas vezes quando ela traria a menina de volta. Ele dizia que ainda não sabia quando isso aconteceria.

“Aí eu fui deixando, mas pedindo conselho de advogados. Até que um dia eu perguntei e ele disse que não deixaria mais a minha filha voltar por causa da pandemia e disse que ela já estava adaptada com ele. Mas eu não aceitei, consultei o advogado e fui até Salvador para buscar minha filha”, afirma. Mas, para surpresa de Sandra, ela foi impedida de ver a criança.

Em um vídeo publicado nas redes sociais, Sandra expõe seu depoimento sobre a situação pela qual está passando e inclui um vídeo em que Raimundo aparece dirigindo um carro na saída da garagem de um prédio e a criança está no banco de trás com os olhos vendados. “Ele impediu o meu contato com ela, tapou os olhos da minha filha para ela não me ver. Me impediu de me aproximar, exigiu teste de covid. Eu saí de lá arrasada, vi que aquilo não era certo e a minha filha não estava bem”, desabafa Sandra.

A partir desse dia, a administradora de empresas procurou a justiça e deu início à batalha para conseguir a filha de volta. Até agora, foram três mandados de busca e apreensão em cinco endereços diferentes, sem sucesso. “Ele recorreu da busca e apreensão, mas o pedido foi negado. Aí ele começou a deixar eu fazer chamadas de vídeo com a minha filha, mas num espaço pequeno, com as paredes forradas com papel para que eu não conseguisse identificar onde ela estava. Eu tentava conversar com ela, perguntar onde ela estava, mas sentia que ela tinha sido orientada a não dizer”, afirma Sandra.

“É um desespero muito grande. São sete meses. A gente nunca viveu tanto tempo assim afastada uma da outra, eu sei que ela sente a minha falta. Eu resolvi postar o vídeo para chamar a atenção das pessoas e ver se ele parava com isso tudo e devolvia a minha filha”, conta Sandra. Com a publicação, Raimundo entrou em contato e informou o endereço em que estava. Sandra foi orientada pela advogada a não ir até o local e aguardar os trâmites da justiça. “É muito frustrante, mas eu peço forças porque eu preciso estar bem para quando a minha filha estiver comigo”, finaliza.

De acordo com a advogada de Sandra, Surama Vilas Boas, foram pedidas novas diligências e uma denúncia foi feita para que a conduta de Raimundo seja apurada. Surama afirma que o pai da criança está sendo acusado, além de alienação parental, de violência psicológica contra Sandra e, por isso, foi solicitada uma medida protetiva. A advogada também entrou com um pedido para que uma nova busca e apreensão seja feita.

Pelo ex-casal sempre ter tido bom diálogo, não há guarda estabelecida. A criança morava com a mãe em Irará e sempre tinha visitas do pai ou ia visitá-lo em Salvador. As coisas mudaram quando Sandra perdeu o emprego e solicitou ajuda financeira de Raimundo. Segundo ela, ele se negava e passou a dizer que queria a guarda da filha.

“Eu pedi apoio financeiro a ele, mas ele sempre falava que não podia. Foi aí que ele começou a me ameaçar dizendo que ia tirar a minha filha de mim. Aí eu fiquei bastante preocupada porque não era como se eu não estivesse trabalhando por não querer, eu não consegui um emprego”, explica. Sandra então recorreu à justiça e um pedido de pensão está em andamento. Desde 2018, foi definida uma pensão alimentícia provisória.

Em resposta às acusações, o advogado de Raimundo, Uelton Oliveira, disse que estas não se sustentam e que provas já foram apresentadas nos processos que correm na justiça. A defesa também informou que “medidas judiciais já foram adotadas pelo pai no sentido de proibir a genitora ou qualquer meio de comunicação de dar notoriedade a estes fatos”.

“A espetacularização de questões que deveriam estar protegidas sob o manto do segredo de justiça (ex vi do inc. II, do art. 189 do Novo Código de Processo Civil), somente revela que a genitora objetiva criar comoção pública com o único propósito de manchar a reputação ilibada deste pai, “criminalizando” o seu direito constitucional de petição, ao contraditório e à ampla defesa, valendo-se deste procedimento como meio de vingança, desatendendo o melhor interesse da menor”, acrescenta a nota.

O TJ-BA e a Polícia Civil foram procurados para prestar informações sobre o caso, mas afirmaram que, por se tratarem de processos envolvendo menores, há segredo de justiça e nenhuma informação poderia ser passada.

Em busca do melhor para a criança

De acordo com a advogada Lara Soares, mestre em Direito Público e professora de Direito Processual Civil da Faculdade Baiana de Direito e Gestão, são frequentes os casos em que as crianças ou adolescentes são usados por um dos pais numa tentativa de atingir a outra parte e é preciso chamar a atenção para as consequências dessas atitudes.

“Muitas vezes isso vem com a fundamentação de que vai ser melhor para a criança, de que, materialmente, é melhor para a criança e, muitas vezes, deixa-se de analisar se, subjetivamente, aquela criança está bem. Isso tudo tem efeitos psicológicos e sociais sobre a criança, muitas vezes prejudicando o seu desenvolvimento”, afirma. “O poder familiar existe não apenas para dar direitos aos pais, mas também traz deveres e eles não estão apenas no campo financeiro e material. Tão importante quanto a alimentação ou outros elementos econômicos, é o estado emocional dessas crianças”, acrescenta Lara.

Segundo a advogada, a questão central geralmente é a alienação parental, que não é considerada como crime, mas pode trazer sanções. “Ela caracteriza esse comportamento de uma das partes de realizar uma campanha difamatória do outro genitor ou de supervalorização de si mesma. Nessas circunstâncias, quando não se consegue alcançar uma composição, o que resta é buscar o poder judiciário e fazer a demonstração das provas da maneira mais vasta possível. Hoje é cada vez mais fácil reunir essas provas, que podem ser fotos, vídeos e conversas por aplicativo, por exemplo”, ressalta.

Lara explica que, mesmo que um dos genitores não tenha a guarda da criança, ambos têm o direitos sobre ela e o problema está no abuso. “Eles podem circular com a criança, levar e trazer. A questão é o abuso desse poder, que pode ser controlado pela justiça cível mediante o ajuizamento da ação específica para regulamentar essa convivência e fazer essa denúncia. Os pais têm direitos, mas é direito da criança conviver com ambos”, explica.

A partir do momento em que for constatado o impedimento por parte de um dos genitores que o outro tenha contato com a criança, poderá caber o pedido de mandado de busca e apreensão. “O comportamento de sair da residência regular e não devolver a criança mesmo com a expedição do mandado, isso pode configurar desobediência e isso sim é um crime. Se for possível reconhecer que o sujeito que tem a obrigação de devolver a criança tem ciência da decisão judicial e está desobedecendo, existe o crime. A depender das circunstâncias, também pode ser que haja configuração de maus-tratos”, pontua a advogada.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro

FONTEcorreio24horas.com.br
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