Uma queda histórica da petróleo, com preços que nesta semana alcançaram o terreno negativo, torna nebuloso o horizonte de países latino-americanos dependentes da renda do hidrocarboneto, em meio à pandemia de COVID-19 que demanda vultosos investimentos públicos na tentativa de atenuar a paralisação econômica.
A queda da demanda mundial propiciada pela pandemia afundou na última segunda-feira o preço do barril de referência WTI para entrega em maio nos Estados Unidos a -37,63 dólares, o que significa que os donos de contratos pagaram para encontrar compradores para o petróleo físico.
Países como Venezuela, Equador ou México, já pressionados pela expectativa de retração econômica, terão que se adaptar a uma queda acentuada das rendas petrolíferas, que podem ser ficar abaixo de seus cálculos pré-estimados, em um momento em que os recursos são mais urgentes.
“Com o petróleo em baixa, se reduz a margem de manobra” para atuar contra a pandemia, diz Andrés Abadía, economista da consultora Pantheon Macroeconomics.
A Venezuela, país mais dependente do petróleo, será de longe a mais atingida, dado o estado calamitoso que sua economia já atravessava.
Mesmo com os custos de produção de petróleo relativamente baixos, em torno de 15 dólares o barril, os preços atuais “vão ser um golpe na indústria convalescente”, afirma Abadía.
O FMI indicou na semana passada um recuo de 15% para economia venezolana em 2020.
Para o Equador, onde a pandemia atinge níveis trágicos, a queda de precos representa um “golpe duríssimo”, segundo o presidente Lenín Moreno.
O petróleo é o principal produto de exportação do país cuja dívida externa ultrapassa 65 bilhões de dólares, mais de 50% do PIB nacional, e que adiou em março seu pagamento as credores e ao FMI, que previu que o PIB equatoriano cairá 6,3% neste ano.
– Pemex, calcanhar de Aquiles do México –
No México, a segunda maior economia da região, mais diversificada e solvente que a Venezuela ou o Equador, a principal vulnerabilidade tem nome próprio: Petróleos Mexicanos (Pemex).
O colapso dos preços atinge em cheio a empresa estatal, cuja dívida excede 100 bilhões de dólares, enquanto luta para reviver sua produção, que caiu pela metade em relação a 2004.
O governo de Andrés Manuel López Obrador congelou a abertura do setor ao investimento privado, iniciado em 2013, reduzindo novas opções de capital para a Pemex.
Seu estresse financeiro foi exposto na semana passada, quando as agências de classificação de risco Fitch e Moody’s reduziram sua dívida para um grau especulativo, depois que o rating de crédito do México também foi reduzido pelas duas agências, além da S&P, antecipando o impacto da COVID-19.
As exportações de petróleo representam cerca de 18% da receita orçamentária do México, que terá suas contas ainda mais pressionadas pela queda da receita tributária devido à contração econômica.
O governo espera uma queda no PIB de até 4% este ano, mas analistas privados apontam quedas de até 9%.
– “O problema número um” da Colômbia –
Na Colômbia, quando a crise da saúde se dissipar, o petróleo se tornará “o problema número um no país”, na opinião do ex-ministro das Finanças Mauricio Cárdenas (2012-2018).
O golpe no orçamento, que contava com um barril a US$ 60,50 e onde a renda do petróleo representava 9,3% da receita de 2019, será sentida no ano que vem, quando as empresas do setor pagarem os impostos deste fatídico 2020.
Para Francisco José Lloreda, presidente da Associação Colombiana de Petróleo, o país precisa de “um Brent entre 40 e 45 dólares” para que o negócio seja lucrativo e o investimento em exploração e produção não diminua. Cerca de 50.000 pessoas dependem desse setor na Colômbia, de acordo com o especialista.
No Brasil, a maior economia da América Latina, o orçamento para 2020 foi preparado com uma expectativa de um barril de Brent a US$ 58,96. As consequências da queda de preços são diversas.
As previsões são de que o impacto nas receitas tributárias será brutal, não apenas pela queda dos impostos, mas também pela suspensão dos leilões de campos de hidrocarbonetos programados para este ano e pelos royalties que os estados produtores não receberão mais, começando pelo Rio de Janeiro.
As ações da Petrobras caíram quase 50% este ano.